Thiago Guimarães e Mariana Oliveira Do G1, em São Paulo
A transparência da gestão pública entra em nova fase nesta quinta-feira (27) no Brasil, com o fim do prazo para que Estados e municípios com mais de 100 mil habitantes publiquem em tempo real na internet informações detalhadas sobre quanto arrecadam e como gastam o dinheiro dos contribuintes.
A exigência está na Lei Complementar 131, um adendo à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) aprovado pelo Congresso em 2009.
As novas regras de transparência começam a valer na sexta-feira (28) para a União, todos os Estados e os 273 municípios mais populosos. Cidades de 50 mil a 100 mil habitantes terão mais um ano para se enquadrar, e o prazo para os demais municípios vai até 2013.
A chamada “Lei da Transparência” ainda é alvo da resistência de prefeitos. Chefes municipais alegam imprecisões no texto da norma e cobram a regulamentação da lei, que ainda não saiu.
“Cada prefeitura tem um conceito de ‘tempo real’ e ‘informações pormenorizadas’”, afirmou ao G1 João Coser (PT), prefeito de Vitória e presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP).
O Tesouro Nacional preparou uma proposta de regulamentação da lei, enviada para avaliação da Casa Civil da Presidência da República. O G1 questionou a pasta sobre a previsão de publicação da regulamentação, mas não obteve resposta.
Mas o ministro-chefe da Controladoria Geral da União (CGU), Jorge Hage, já afirmou que a lei é “autoaplicável”, ou seja, não precisa de regulamentação para vigorar.
Quem descumprir a lei está sujeito à suspensão das transferências voluntárias da União, que somaram em 2009 R$ 5,1 bilhões para municípios e R$ 3,5 bilhões para Estados.
Tempo real
Para cumprir as exigências da lei, a CGU lança nesta quinta uma nova ferramenta no Portal da Transparência da pasta, no ar desde 2004. A consulta “Informações Diárias” trará dados detalhados por dia sobre a execução orçamentária de todas as unidades do Executivo federal.
O conceito de “tempo real” adotado pela CGU é, portanto, o de 24 horas. Segundo a pasta, para atender a nova lei, o portal será recarregado, em média, com 200 mil novos documentos por dia. Até então as atualizações eram mensais.
Em relação aos Estados, a CGU contabiliza 12 unidades da Federação (AL, BA, CE, RN, ES, GO, MA, MT, PA, PR, PE e RS) com portais de transparência nos moldes do site da pasta, com atualizações mensais ou em maior intervalo.
O órgão não sabe quantos municípios já cumprem a lei. As duas principais entidades municipalistas do país - a FNP e a Confederação Nacional de Municípios - também não fizeram balanço semelhante.
Segundo dados de 2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 9 das 273 prefeituras de cidades com mais de 100 mil habitantes não mantinham páginas próprias na internet.
Presidente da FNP, Coser disse que a Lei da Transparência é um “importante instrumento de controle social”, mas reconhece que “uma ou outra” prefeitura não conseguiu se organizar para disponibilizar os dados no prazo.
Ranking da Transparência
Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas, ressalta que os municípios tiveram um ano para preparar os dados. “É um argumento ridículo dizer que não estão preparados. É um processo simples, até porque são informações que as prefeituras já possuem.”
A ONG encabeça o chamado Comitê Técnico do Índice da Transparência, formado por especialistas que vão criar um ranking para atribuir notas às administrações públicas, de acordo com o grau de transparência de seus sites.
Se a prefeitura ou governo disponibilizar as contas públicas para download, por exemplo, ganhará pontos no índice. O mesmo se fornecer um canal de interação por telefone, e não apenas por e-mail.
Fiscalização
E quem ficará responsável pela fiscalização da nova lei? Pelo texto da norma, qualquer “cidadão, partido político, associação ou sindicato” poderá denunciar o descumprimento ao respectivo Tribunal de Contas ou Ministério Público.
Consultados pelo G1, a CGU, o Tribunal de Contas da União e a Secretaria do Tesouro Nacional informaram não ter responsabilidade na fiscalização.
“As denúncias vão acontecer se a sociedade se envolver na lei. Daí os Ministérios Públicos vão ter que tomar providências. É preciso que a lei vingue para quebrar a cultura do sigilo das contas nos municípios”, afirma Castello Branco.