Em debate realizado nesta segunda-feira (29) na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) sobre as consequências da crise econômica de 2008 sobre os preços de commodities e alimentos, os especialistas convidados destacaram a reação robusta do Brasil diante da volatilidade do mercado e afirmaram que, com a devida cautela, as condições são mais favoráveis para o enfrentamento de uma nova recessão mundial. A audiência, parte do ciclo de debates intitulado Rumos da Política Externa Brasileira, foi presidida pelo senador Fernando Collor (PTB-AL); os debatedores também responderam às perguntas e comentários dos senadores Roberto Requião (PMDB-PR), Ana Amélia (PP-RS) e Cristovam Buarque (PDT-DF).
O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, e ex-economista chefe do Banco Santander, vê perspectivas mais favoráveis para o futuro em comparação com a crise de 2008, na qual, como notou, o bloco dos emergentes recuperou mais rapidamente seu nível de produção do que os Estados Unidos e os países da Zona do Euro. Nos próximos meses, segundo Schwartsman, as economias desenvolvidas deverão continuar praticando taxas de juros próximas de zero e seguir com uma política monetária extremamente frouxa, provocando um fluxo de capitais que terá impacto no mercado de commodities.
Em sua análise, a China terá que fazer ajustes, mas a equipe econômica chinesa ainda está dividida entre desacelerar a economia através da elevação de juros ou valorizar gradualmente sua moeda. De qualquer forma, segundo o economista, a alta nas commodities deve ser relativamente duradoura, mas o crescimento da Ásia deve continuar ajudando o setor exportador do Brasil.
O professor Carlos Mielitz Neto, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) salientou que os capitais se movimentam rumo a atrativos, o que inclui as oportunidades na produção agrícola; a situação aumenta a pressão de preços sobre as commodities. Mielitz assinalou as distorções causadas pela especulação financeira: segundo as estatísticas que apresentou, 90% dos contratos são meras especulações, e a maior parte das negociações de produtos básicos são praticadas por monopólios ou monopsônios que amplificam as tendências através de formação de estoques.
O professor destacou que a produção de alimentos depende basicamente de terra e água, e numa situação de escassez crescente no futuro o Brasil estará mais bem posicionado do que a África. Carlos Mielitz Neto defendeu mais intervenção no mercado e mostrou esperança quanto à criação de um imposto mundial sobre operações financeiras.
José Maria da Silveira, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), mostrou o vínculo entre o aumento dos preços de energia e a pressão sobre os preços de produtos agrícolas. Numa perspectiva de segurança alimentar no futuro, a fragilidade na Ásia é maior que a do Brasil, destacando que Paquistão e Índia têm gerado bombas populacionais que provocarão pressão crescente sobre o aquecimento global. O professor, que correlacionou a produtividade ao uso de tecnologia, elogiou a atuação da FAO na resposta à crise de 2008 e pediu pesquisas que levem a fertilizantes adaptados à realidade brasileira, destacando o brilhantismo do trabalho da Embrapa.
Eduardo Teixeira, economista, ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda, ex-diretor da Petrobrás e consultor de empresas, fez um discurso otimista ao fazer o retrospecto da crise de 2008 e suas consequências, notando o mercado interno como fator de crescimento da economia. Em sua avaliação, antes do estouro da bolha especulativa, o Brasil tinha uma economia sólida, mas sujeita a contaminação externa, e a resposta do país aos problemas financeiros foi decisiva. Porém, Teixeira considera que é um mito pensar que a crise não tenha afetado o Brasil. A taxa de juros segue muito alta, o que tanto reflete problemas na economia quanto cria outros problemas: na sequência de 2008, somente os bancos centrais do Brasil e da Europa aumentaram seus juros.
Para o economista, há muito espaço para aumento do investimento público, destacando o setor de habitação, mas os riscos hoje são semelhantes aos de 2008. Um problema em vista é a necessidade de mudança da taxa de câmbio, que pode afetar empréstimos externos privados, mas, segundo seus cálculos, o Brasil está mais preparado para essa adversidade.